A Fascinante Jornada da Família Mafort: Da Suíça de Lucerna ao Florescimento no Brasil

A história da família Mafort é uma rica crônica de imigração e adaptação que se estende por séculos, com suas raízes na Suíça e um notável florescimento na região serrana do Rio de Janeiro. O sobrenome Mafort é uma variação fonética e ortográfica do sobrenome suíço-germânico original, Marfurt, alteração essa que se consolidou no Brasil ao longo do século XIX.


I. Origens na Suíça: O Berço dos Marfurt (Séculos XVII–XIX)

A linhagem que deu origem aos Mafort no Brasil provém da família Marfurt, com uma concentração significativa no cantão de Lucerna, na Suíça. As evidências apontam para a localidade de Nottwil, e, mais especificamente, para a região de Fischbach.

O Ancestral Mais Antigo Documentado (1780)

O registro mais antigo rastreado da família Marfurt/Mafort na Suíça remonta ao final do século XVIII. Um dos ancestrais centrais para a linhagem brasileira é Johann Melchior Marfurt, que nasceu em 1780 em Fischbach, Lucerna. Ele era casado com Alísia Halbstein, nascida em 1790, também em Fischbach. Johann Melchior era germanófono e católico.

Posição Social e Heráldica

A família Marfurt pertencia à burguesia respeitável de Lucerna, possuindo direitos de cidadania (Heimatrecht) em múltiplas comunas do cantão, como Dagmersellen, Langnau e Willisau. Documentos históricos revelam que um ancestral, Hans Marfurt, serviu como Untervogt (vice-magistrado) em Langnau em 1686. A posse de “Wasserrechte Mühlsecken” (direitos hídricos para moinhos) também atesta a prosperidade e status social da família na Suíça. O brasão da família Marfurt, registrado no Arquivo Estadual de Lucerna, reflete esses valores burgueses, utilizando o campo dourado (simbolizando nobreza e prosperidade), uma cruz vermelha (fé e coragem) e um monograma “M” entrelaçado (continuidade familiar).

Crise e Decisão de Emigrar (Início do Século XIX)

A primeira metade do século XIX na Europa foi marcada por instabilidade econômica e social. O fim das Guerras Napoleônicas e as anomalias climáticas, como “o ano sem verão” de 1816, causaram fome e miséria na Suíça. Foi nesse cenário que o Brasil, um império recém-independente, passou a promover ativamente a imigração europeia.

Em 16 de maio de 1818, o “Tratado de Amizade e Cooperação” foi assinado entre o agente do Rei Dom João VI e o Cantão de Friburgo, prometendo aos colonos subsídios, lotes de terra, ferramentas, gado, subsídio diário por um ano e liberdade de culto.


II. A Travessia para o Brasil e a Chegada (1819–1820)

A trajetória da família Marfurt está ligada à colonização de Nova Friburgo. Johann Melchior Marfurt, Alísia Halbstein e seus filhos Joseph (nascido em 1816) e Anna Maria (nascida em 1818), além de Antoine Burri (agregado/enteado), embarcaram como parte do contingente suíço em 1819.

A Jornada Mortífera

  1. Descida do Reno (Maio/Junho de 1819): A jornada começou com a descida do Rio Reno em barcaças superlotadas, marcada por atrasos e más condições de higiene.
  2. Travessia do Atlântico: O patriarca e sua família embarcaram no navio Camillus, um brigue de três mastros. O navio partiu de Amsterdã em 10 de outubro de 1819.
    • A travessia durou 122 dias.
    • As condições a bordo eram precárias, com superlotação, porões escuros e úmidos, falta de água potável e comida estragada.
    • O ambiente era propício a doenças como a “febre nervosa” (tifo/tifoide), resultando em alta mortalidade. Nove óbitos foram registrados no Camillus (7,6%).
    • Durante a travessia, Anna Maria Marfurt, de apenas 1 ano, faleceu a bordo do Camillus em 5 de outubro de 1819.
  3. Chegada ao Rio de Janeiro: O Camillus chegou à Baía de Guanabara em 8 de fevereiro de 1820. Os imigrantes foram colocados em quarentena devido ao estado de saúde.
  4. Estabelecimento em Nova Friburgo: A subida da Serra do Mar foi exaustiva. Os sobreviventes, incluindo a família Marfurt, chegaram ao destino em 18 de fevereiro de 1820.
    • O local encontrado era apenas uma clareira na mata, sem as estruturas prometidas.
    • A colônia de Nova Friburgo foi oficialmente fundada em 3 de maio de 1820.
    • A família Marfurt fixou-se na casa 84 e lote 87.

III. A Consolidação e a Metamorfose do Sobrenome (1820–1900)

O Início da Linhagem Brasileira

No Brasil, a família Marfurt continuou a crescer. O primeiro filho nascido em Nova Friburgo foi João Marfurt, em 20 de setembro de 1820.

Outros filhos do patriarca Johann Melchior Marfurt (nascido em 1780) e Alísia Halbstein (falecida em 7 de março de 1868, em Nova Friburgo), incluem:

  • Anna Luiza Marfurt (nascida em 1831 em Macaé; faleceu em 1852). O pai, Johann Melchior, havia partido para Macaé em agosto de 1835, sugerindo deslocamentos familiares.
  • José Luciano Marfurt (nascido cerca de 1836, em Nova Friburgo).

A Metamorfose para Mafort

A transição de “Marfurt” para “Mafort” (e variantes como Manfort e Maforte) foi impulsionada pela dificuldade de pronúncia e escrita germânica para os oficiais brasileiros e pelo processo natural de aportuguesamento.

O nome “Mafort” já estava consolidado na segunda e terceira gerações nascidas no Brasil:

  • 2ª Geração: João Marfurt (nascido em 1820) casou-se com Barbara Elisabeth Borer em 1852. Tiveram filhos, como José Melchior Marfurt.
  • José Melchior Mafort (nascido em 1856 em Nova Friburgo), filho de João Marfurt, é um exemplo documentado dessa transição, aparecendo em registros posteriores já com a grafia “Mafort”.
  • 3ª Geração: Manoel Mafort (nascido em 1897) é um descendente onde o sobrenome Mafort já aparece fixo.

Expansão e Casamentos Interfamiliares

A 2ª geração de Marfurt/Mafort se casou e gerou uma vasta descendência. Joseph Marfurt (1816–) casou-se com Anne Knupp em 1839, e José Luciano Marfurt (1836–) casou-se com Maria José Knupp em 1867.

A terceira geração (bisnetos) e as subsequentes estabeleceram fortes laços matrimoniais com outras famílias suíças pioneiras de Nova Friburgo, incluindo Knupp, Borer, Tardin, Freese, Werner, Perroud, Overney e Heggendorn.


IV. A Dispersão e os Dias Atuais (Século XX e Além)

As gerações seguintes (tataranetos e pentanetos) consolidaram a presença da família Marfurt/Mafort em diversas localidades do Rio de Janeiro:

  • Nova Friburgo (centro da colonização)
  • São José do Ribeirão, Bom Jardim
  • Cantagalo
  • Macaé de Cima
  • São Pedro da Serra
  • Barra Alegre

Ramificações para Minas Gerais

No final do século XIX e início do século XX, alguns descendentes migraram para Minas Gerais, fixando-se em Luisburgo e outras regiões mineiras.

Um exemplo dessa migração é a linhagem de Balthazar Marfurt (2ª Geração, nascido em 1842) e Deolinda Knupp, cujo filho, João Militão Marfurt, migrou para Luisburgo, MG, onde o sobrenome foi registrado em novas variações como Mofortt. A documentação cataloga diretamente pelo menos 47 descendentes até a quinta geração, ilustrando a continuidade da família.

Atualmente, os descendentes dos pioneiros suíços, que se espalharam e se adaptaram ao longo de dois séculos, continuam a carregar o sobrenome Mafort (e suas variações, como Maforte, Manfort e, ocasionalmente, Maffort). A história da família Mafort é um testemunho da capacidade de superação e da rica herança cultural deixada pelos imigrantes que ajudaram a construir o Brasil.